8 de ago. de 2011

Goianinha faz bem

Rubens Lemos Filho

Jornalista*

No silêncio dos seus casarões seculares, na robustez de sua vegetação e no calor do seu povo, Goianinha, a 60 quilômetros de Natal, é uma cidade que faz bem. Ao América está sendo um bálsamo de redenção. Tenho um velho amigo em Goianinha, que há tempos não encontro, senhor do Bosque, seu recanto e homem de fibra e palavra. Prenome Breno, óbvio sobrenome Barbalho.
Breno Barbalho, na última vez que encontrei, andava de chapelão e ostentava tranqüilidade, traço comum dos alpendres, gestual mantido pelos ventos agrestes. Breno Barbalho é pacato, discreto, desconfiado, como os legítimos nativos de coração gigante.
Goianinha é caminho e parada. Por ela, vai-se ao litoral modista de Pipa e seus estrangeiros passeando em uma viela, dormindo em hotéis caros ou pousadas modestas. Por ela segue-se adiante, rumo a João Pessoa, Recife e até Porto Alegre. Goianinha está na margem da BR-101.
Goianinha chama atenção pela sua feira, mercado persa quase litorâneo, que fica bem visível, à entrada da cidade, perto da igreja matriz, imensa e de impressionante arquitetura. Silenciosa em frente à praça onde meninos brincam, casais namoram e politiqueiros palpitam sobre quem ganha eleição sem combinar com as urnas.
Goianinha tem fazendas do tempo dos nossos antepassados milenares. São bem cuidadas, convidativas e até assombrosas, nos mistérios perdidos dentro de engenhos abandonados. Goianinha é assim. Mantém vivas suas tradições e vem sendo ótima anfitriã do América na escalada da Série C.
Os jogos do América no Nazarenão estão se tornando um ótimo programa de fim de semana para os seus torcedores. É um passeio agradável. O caboclo pega a namorada, ou a mulher, se for casado, ou se não for, também, os meninos, guarda uns trocados e sai de Natal sossegado.
Almoça em Nísia Floresta, de restaurantes vastos. Camarão jamais me atraiu, mas é uma delícia para os que gostam. Tem todo tipo de crustáceo porque a região é de sal e mangue. Há peixe sobrando. Há carne de sol, queijo do reino, de manteiga, queijo de coalho, manteiga do sertão, guiné, cabrito, bolo da moça, bolo da descabaçada, tudo de bom. Todas as adas imagináveis. Panelada, rabada, buchada.
É este o clima, é a tal atmosfera que está fazendo bem ao América. Duas vitórias em Goianinha, a última por 4x0, que dispensa análises táticas. É só olhar o semblante de felicidade do povo vestido de vermelho. É um estado de euforia, de congraçamento, de união, que afastam qualquer necessidade de se pensar em jogar noutro canto.
Regras básicas de boas maneiras ensinam que é preciso tratar bem quem bem recebe. Goianinha abriu seus braços para um longo abraço ao América e nasceu uma relação de cumplicidade e alegria. Goianinha agora é cidadela rubra.
O futebol é mágico por pendular. Um dia se está no topo, depois no porão. O América está cumprindo peregrinação que conhece de salteado. Já subiu, desceu, foi humilhado e ressurgiu. Hoje, e não existe qualquer conotação sociológica ou arrogante, o América está mais popular que o ABC.
É nas dificuldades que se aproximam as pessoas. E somar é virtude essencial dos humildes. Nos filmes, nos livros, na vida real, há histórias de vizinhanças proletárias. Bate-se na porta em busca de um naco de sal, de feijão, de farinha. Quem tem um pouco, do pouco tira para ajudar o outro.
E do nada que se prenunciava o América, desenha-se um caminho de liberdade e reconstrução. De amor e vitória. De suor e gols. O América sempre foi altivo em campeonatos nacionais. Agora tem uma casa para lhe abrigar, um povo pra lhe receber e defender. Para lhe querer bem. Goianinha foi um gol de placa. Goianinha e o América estão casados. Muito bem e felizes.

*Publicado na Coluna Passe Livre, do Jornal de Hoje, em 08/08/2011
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7 comentários:

Anônimo disse...

Faz bem à alma, ao corpo, ao coração...Bendita seja Goianinha redentora do América Futebol Clube e da sua apaixonada torcida.

Marcolino disse...

Muito bonita e bem elaborada a crônica de Rubinho. Parabéns!

Anônimo disse...

Só prá descontrair:Enquanto Rubens Lemos faz uma crônica dessa veja essa de um coveiro conhecido da nossa imprensa sobre o América; "Vou dizer no momento em que está vencendo. O América PRECISA jogar pelo lado esquerdo. EMBORA os gols tenham saído pelo lado ESQUERDO, o time precisa usar mais esse setor." KKKKKK É uma piada amigo!!!!!
ADAIL PIRES

Anônimo disse...

Sérgio, não é de hoje que admiro o jornalista Rubens Lemos Filho - aliás, sendo casado com uma prima minha, pouco o vejo - pela coerência e equilíbrio com que tão bem escreve suas crônicas. Principalmente quando, ao desenvolver seu tema, faz o leitor se sentir personagem e viajar junto às suas idéias, sempre com boas pitadas do universo sertanejo. Mais uma vez ele nos faz viajar, uma viagem que eu mesmo fiz no sábado. E não só pelo placar elástico, mas por toda atmosfera que envolve o espetáculo! Parabéns à diretoria do América e a prefeito Junior Rocha por ter acreditado não em um sonho, mas na realidade que hoje vivem o América e a cidade de Goianinha. E a Rubinho, continue esse belo trabalho, por você e pelos poucos "jornalistas" que realmente honram a profissão. MECÃO RUMO Á 2ª DIVISÃO, COM HUMILDADE E PÉS NO CHÃO, CHEGAREMOS LÁ!
MARCOS AURÉLIO
depaularn@hotmail.com

Gustavo disse...

Crônica leve, solta, que flui muito bem. Da mesma forma que deve ser o futebol. Por jogar fora de Natal, o América deve até estar conquistando novos torcedores.
Gustavo Porpino (Brasília - DF)

Anônimo disse...

Parabéns, Rubens Lemos! Bela crônicaa que traduz
o estado de graça que nós americanos estamos vivendo. E há quanto tempo esperávamos...
Reconhecidamente um abecedista, voce sabe colocar a razão acima da emoção.
Como seria bom que houvesse respeito mesmo onde exixtissem divergências.
O adversário não é nosso inimigo, apenas diverge
da nossa escolha.
Não podemos e nem devemos deixar de reconhecer
o empenho do Sr. Prefeito de Goianinha e a acolhida harmoniosa da cidade aos americanos que frequentam o Nazarenão.
Voces já fazem parte desta história!
Agora, rumo à Série B. Com trabalho, pés no chão, humidade, responsabilidade e respeito, chegaremos lá.

Anônimo disse...

Rubinho não supreende mais. Tudo que escreve reflete a vida. Seus textos são d++++.
Walsil.

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